As polêmicas
Jackie e sua personalidade forte
Jackie e sua personalidade forte
No início da década de 80, logo após a Olimpíada de Moscou, comecei a me envolver em algumas polêmicas com a CBV. Nós, atletas, éramos explorados, e não fazíamos nada para reverter a situação. Fui cortada 3 vezes e em outras não me convocaram mesmo sabendo que eu era uma das melhores levantadoras do país. Toda essa confusão culminou com o famoso episódio do uniforme vestido pelo avesso, que encerrou de vez meu ciclo na seleção.
Sem emprego, pois os clubes diziam que eu pedia muito alto, comecei a me virar sem o vôlei. Fiz coisas do arco da velha, cheguei até a rifar a minha Vespa, que era italiana e fazia maior sucesso. Hoje acho graça disso tudo, mas na época realmente comi o pão que o diabo amassou.
Pouco depois, em 87, me transferi para a Itália, contratada pelo CIV CIV Modena. Era um clube considerado de porte médio, mas chegamos em segundo lugar e eu fui eleita a melhor estrangeira do campeonato. Paralelamente, comecei a jogar vôlei de praia nos EUA, e a partir daí não quis mais saber de outra coisa. Conquistei todos os títulos possíveis e decidi me dedicar de corpo e alma ao novo esporte.
Mas, vocês sabem. Ninguém aguenta viver longe de casa por muito tempo. Comecei a jogar também torneios pelo Brasil e acho que contribuí muito para a evolução e para o sucesso do esporte por aqui. Joguei com várias parceiras, como a minha amiga Isabel, companheira inseparável de “confusões”; Sandra, com quem fui bicampeã mundial e campeã olímpica; e hoje faço dupla com a Cláudia.
Fui cortada da seleção três vezes. Em 85, o corte aconteceu porque me recusei a fazer propaganda gratuita para o patrocinador.
Sempre fui e sempre serei uma mulher de personalidade forte. Faz parte da minha essência, da minha alma. Se acho que alguma coisa está errada, se vejo que tem alguns se dando bem em cima do nome dos outros, boto mesmo a boca no trombone. Se lutar pelo que você acredita significa ser rebelde, contestadora, então eles, dirigentes e ex-técnicos da seleção, estavam certos: eu era mesmo sinônimo de rebeldia.
Quando fui convocada pela primeira vez, achava tudo lindo. Na cabeça de uma menina de 14 anos, era aceitável ficar concentrada num casarão praticamente só com mulheres. Valia qualquer sacrifício para fazer parte da seleção, defender o seu país, etc…Da segunda vez foi um pouco mais difícil, na terceira pior ainda e assim sucessivamente. Claro, chegou uma hora que a paciência acabou.
Fui cortada da seleção 3 vezes, todas por indisciplina. Não sou santa, mas não podia deixar barato o que faziam comigo e com minhas companheiras. Na época me acusaram de tudo, mas hoje sou cumprimentada por ter iniciado a luta para um tratamento melhor aos atletas. Em todos os sentidos.
Esse foi o derradeiro. Logo nos primeiros dias de treino, o Jorge de Barros, que era o técnico, me colocou no banco e efetivou a Ana Richa como titular. Não entendi, mas segui treinando normalmente. Sabia que tinha condições de recuperar a posição. Modéstia à parte, eu me considerava mais jogadora do que ela, e a comissão técnica sabia disso.
Analise a situação. Eu estava sem clube e tentei ganhar uma ajuda de custo da CBV. Com a alegação que se dessem para mim teriam que dar para todas, eles recusaram. Ou seja, estava lá de graça, apenas para defender o meu país. Para piorar, sem que nenhum atleta fosse avisado, começaram a distribuir uniformes de treinamento da Rainha, novo patrocinador da seleção.
Cansada de tantas injustiças, resolvi treinar com o uniforme do avesso. Se o time masculino recebia pela propaganda, por que eu também não poderia receber? Era meu direito. Só que para variar fui chamada de rebelde, contestadora…, e me cortaram novamente. No ano seguinte, sem a minha presença, a seleção foi disputar o Mundial de Praga e todas as jogadoras receberam a tal ajuda de custo. Curioso, não??
Passei por momentos difíceis, mas mantive meus princípios. Afinal, por que eu não poderia receber o mesmo salário de uma estrangeira?
Nossa vida é como uma montanha russa. Em certos períodos, tudo que a gente faz dá certo, em todos os aspectos. Você se apaixona, brilha na sua profissão, conhece pessoas legais, enfim, qualquer coisa se transforma em um conto de fadas. Mas também há aqueles momentos difíceis, que hoje chamam de inferno astral. Pois é, eu vivi o meu entre 84 e 85. Passei por situações que jamais imaginara, e só consegui sair do buraco porque meus amigos me ajudaram. Senão…
Tudo começou no final de 84. Sabia do meu valor, do que meu nome representava para o vôlei e de quanto minha imagem valia comercialmente. Não aguentava mais jogar, levantar títulos, e não ser reconhecida por isso. Vi muita coisa feia, como jogadoras entrando em leilão, e resolvi me valorizar. Fiz um preço e pronto. Os dirigentes, como eu esperava, acharam um absurdo. Não queriam dividir os lucros, é claro.
Então, como não encontrava clube disposto a pagar o exigido, tive de me virar para ganhar dinheiro. Fiz jogos de demonstração do Oiapoque ao Chuí, rifei minha adorada Vespa 79, vendi camisetas com meu nome, lancei um livro… Tudo para ganhar meu sustento. Mas mantive minha posição: não me vendi por pouco.