Jackie Silva participou do terceiro capítulo da série do Jornal O Globo que aborda a participação das mulheres em cargos de liderança dentro do esporte brasileiro.
#OJogoDelas: Minoria à frente de seleções e confederações.
Terceiro capítulo da série aborda o caminho das mulheres a postos de comando
por Tatiana Furtado
07/03/2016 7:00 / Atualizado 07/03/2016 11:38
Elas são maioria no país, nas universidades e nos doutorados, segundo os dados do IBGE. Mas a representatividade feminina estagna nos cargos de comando. É assim em toda a sociedade brasileira. É assim no esporte brasileiro. As atletas conseguiram chegar ao topo do pódio, mas, na maioria das vezes, havia um homem na chefia. Esse é o assunto da terceira matéria da série #OJogoDelas, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, que se comemora na terça-feira.
Porém, quantas dessas mulheres serão comandadas por outras diretamente? Bem poucas. Ao contrário do caminho natural dos ex-atletas, que ou se tornam técnicos ou assumem cargos de direção no esporte, elas, por diferentes motivos, encontram algumas barreiras. Entre os 28 esportes olímpicos — e as modalidades de cada um — são poucas as que possuem uma mulher à frente das seleções principais. E desse mesmo número de confederações, há apenas uma presidente: Maria Luciene Resende, da Confederação Brasileira de Ginástica.
Apenas uma presidente de confederação olímpica
Maria Luciene tem a seu favor estar à frente de um esporte que, inicialmente praticado apenas por homens, tornou-se extremamente feminino. Em seu segundo mandato na confederação, ela conta que, felizmente, não sofreu preconceitos e conseguiu crescer dentro do esporte.
— Na ginástica é comum mulheres ex-atletas seguirem no esporte como técnica e cargos de comando, com representatividade em escolas e clubes. A exemplo citamos grandes treinadoras e coordenadoras como Camila Ferezin, treinadora da seleção de ginástica rítmica de conjunto; Tatiana Figueiredo, da ginástica de trampolim; a Monika Queiroz, técnica da ginasta Natália Gáudio, seleções já classificada para os Jogos Olímpicos, e na ginástica artística feminina temos a Keli Kitaura e Iryna Ilyashenko como treinadoras e a coordenadora Georgette Vidor. Vale destacar que temos várias árbitras nacionais e internacionais, cargo muito respeitado na modalidade. Como dirigentes estaduais de federações, temos apenas quatro homens. Sendo assim, essa situação não se aplica a nossa modalidade — explica.
Caso semelhante da técnica da seleção brasileira de nado sincronizado, Maura Xavier, que comandava um time só de meninas até ano passado. Em 2015, foi introduzido o dueto misto. Ela acrescenta, que, por ser uma profissão nem sempre muito bem remunerada, as ex-atletas não sigam por esse caminho.
— Acho que estamos em fase de mudança, vindo aí uma nova geração sem preconceitos. Mas ainda há resquício da sociedade machista em algumas áreas. Tive sorte por trabalhar num esporte essencialmente feminino até o ano passado. Dois anos após formada, já assumi a seleção de base e estou há oito anos na adulta — diz ela, que dirige, além das meninas, a comissão médica composta por quatro homens.
No entanto, há os clubes do bolinha. O vôlei de quadra, por exemplo. Tanto as seleções quanto os times da Superliga – 24 no total – são comandados por homens. Primeira mulher a conquistar uma medalha olímpica — ouro ao lado de Sandra Pires no vôlei de praia, em Atlanta-96 —, Jackie Silva viveu alguns dissabores na sua época como atleta e técnica, logo depois de encerrar a carreira.
— É um espaço difícil de penetrar mesmo. Principalmente no Brasil. Morei muitos anos na Flórida e lá as mulheres estão muito mais presentes no ambiente do esporte. Acho ruim para o desenvolvimento do esporte, tinha que ter pontos de vista diferentes. Lembro que como jogadora na quadra, era difícil que uma ideia minha fosse bem recebida. Na praia, cheguei a ser técnica da base, mas a pressão era muito grande por ser mulher. Para mulher, muitas vezes, tem que lutar todo dia para furar esse bloqueio, é cansativo. Nem todas querem agir assim para conseguir algo — disse Jackie, recordando que o primeiro pódio de uma brasileira só veio 100 anos depois da primeira Olimpíada da Era Moderna.
Também medalhista olímpica no vôlei de praia — prata em 2000 e 2004 —, Adriana Behar optou pelo mundo corporativo. Hoje, ela é gerente geral de planejamento esportivo do COB, onde participou do Programa de Carreira do Atleta, e afirma que há mais oportunidades para as mulheres. Mas também é preciso ter interesse e saber gerenciar o pós-carreira esportiva. Ela relembra, no entanto, que as diferenças de gênero no esporte já foram maiores.
— Não sofri ofensas diretas por ser mulher, porém passei por um momento no vôlei de praia no qual a premiação era diferente entre homens e mulheres; o número de duplas era diferente… Mas isso não desanimou, pelo nosso esforço sabia que isso seria revertido. Nunca me abalou e me deu mais força para brigar mais ainda — afirma Adriana, que reconhece as diferenças entre ser comandada pelos dois sexos . — A Letícia (Pessoa) é a minha maior referência. Foram 10 anos juntas. Obviamente, que há diferença: homem é mais direto, mais objetivo, mais transparente no que quer. A mulher também tem essa postura direta, mas com uma visão mais materna, considera outros aspectos. A grande questão é que respeito, admiração e profissionalismo não têm gênero.
Ex-técnica de Adriana Behar e atual treinadora da seleção de vôlei de praia, Letícia corrobora com a pupila. Hoje, segundo ela, ganhar um lugar de comando no meio esportivo passa por uma questão de vontade de lutar pelo seu lugar. Porém, admite que, em determinadas áreas, como o vôlei de quadra, há preconceito de gênero.
— Na quadra, preferem contratar homem a mulher. Isso é fato. Porém, em qualquer carreira vai depender do resultado. Se tiver conquista, vai ser respeitada — acredita.
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